No 12º episódio do podcast Maconhômetro Educação, Francisco Coelho e Luciana Bessa receberam Layla Waltenberg, artista plástica, professora, cientista política e pesquisadora que tem desenvolvido um trabalho inovador na interseção entre arte, política e educação sobre drogas. Doutoranda em Ensino de Biociências e Saúde na Fiocruz, ela pesquisa o uso dos fanzines como ferramenta pedagógica para a educação sobre drogas no contexto escolar. Ela também é uma das principais colaboradoras do Cannabis Monitor.
Uma trajetória multidisciplinar
A trajetória de Layla Waltenberg é marcada pela convergência de diferentes áreas do conhecimento. “A arte sempre fez parte da minha vida. Eu sempre gostei da parte musical também, sempre estive ligada. E acabei fazendo uma faculdade de ciência política logo antes de fazer a faculdade de artes”, conta ela, explicando como essa formação diversificada contribuiu para seu trabalho atual.
Professora de Artes em duas redes municipais, Layla relata no programa como sua experiência em sala de aula a aproximou do tema da educação sobre drogas: “Como eu estava já ligada a ser professora, eu estava vivendo esse dia a dia com os alunos, e acho que ouvindo muitos relatos deles e sendo impactada por isso, acabei sendo atravessada, né? Acho que a educação sobre drogas acabou me atravessando.”
Sua pesquisa de doutorado na Fiocruz busca analisar as produções visuais dos estudantes sobre o tema das drogas. “Minha ideia é justamente conseguir pensar o que esses estudantes estão produzindo visualmente nessa temática das drogas. Analisar o que eles produzem, como que eles representam essas vivências deles“, explica.
Fanzines: resistência e expressão cultural
O fanzine é o elemento central da pesquisa e da prática pedagógica de Layla. Ela os define como “artefatos artesanais, publicações autorais acessíveis” que têm um aspecto “do it yourself”, ou “faça você mesmo”. Segundo a pesquisadora, os fanzines são geralmente vistos como uma forma de resistência e expressão cultural e oferecem alternativas, tanto à cultura de massa, quanto à lógica do consumo, e essas estruturas de produção de livros ou materiais de divulgação.
Uma característica importante dos fanzines, destacada por ela, é seu caráter paradoxal: “Ao mesmo tempo que ele depende de caráter, uma coisa muito pessoal, muito local, ele também precisa se sustentar, ter uma base de alguma forma”. Essa dualidade entre o pessoal e o coletivo torna o fanzine uma ferramenta especialmente interessante para trabalhar temas complexos como as drogas.
“Eu acho que o fanzine é uma ferramenta muito potente para a gente trabalhar a educação sobre drogas, porque ele permite que a gente trabalhe com a experiência dos estudantes, com o que eles trazem, com o que eles vivenciam, com o que eles conhecem, e ao mesmo tempo a gente pode trazer outras informações, outros olhares, outras perspectivas”, afirma Layla.
Repensando a Educação sobre Drogas
Um dos pontos mais importantes abordados no episódio é a necessidade de repensar as abordagens tradicionais da educação sobre drogas nas escolas. Referenciada na pesquisadora (e co-apresentadora do Maconhômetro Educação) Maria de Lourdes da Silva, Layla critica o chamado “currículo mínimo”, que geralmente se limita a classificações, riscos e efeitos das substâncias.
Em contraposição a essa abordagem limitada, ela compartilha sua experiência com o seu projeto “fanzines de ciência canábica”, desenvolvido para uma oficina com alunos da EJA (Educação de Jovens e Adultos) em uma escola estadual em São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro.
Esses fanzines incluiam aspectos históricos, como uma linha do tempo das coisas que aconteceram com a maconha no Brasil, além de informações sobre os diversos usos da planta e sobre associações canábicas no Rio de Janeiro. “Trazer outros aspectos para poder povoar o imaginário na questão da educação sobre drogas, a gente não precisa ficar limitado”, defende.
Para a pesquisadora, é fundamental ampliar o escopo da educação sobre drogas: “Eu acho que a gente precisa pensar a educação sobre drogas de uma forma mais ampla, não só focada nos riscos e danos, mas também nas potencialidades, nas histórias, nas culturas, nas políticas que envolvem essas substâncias.”

Desafios na abordagem do tema nas escolas
Layla não ignora os desafios de trabalhar com o tema das drogas na escola, apontando como um dos maiores desafios o rompimento com o tabu, com o silêncio que existe em torno do tema das drogas nos ambientes educacionais. “Porque a gente sabe que os estudantes estão vivenciando isso, estão em contato com isso, mas a escola muitas vezes não consegue abordar esse tema de uma forma que faça sentido para eles”, pondera.
Ela defende uma abordagem mais holística: “Quando a gente fala de educação sobre drogas na escola, a gente precisa pensar que não é só falar sobre os riscos e danos, é falar sobre a vida, sobre as escolhas, sobre as relações, sobre o contexto social, político, econômico em que essas substâncias estão inseridas.”
Arte, ativismo e educação
A dimensão política do trabalho de Layla também se manifesta em seu envolvimento com movimentos sociais, como a Marcha da Maconha. Ela relata como sua participação começou através da arte: “Uma coisa que acabou me atraindo para poder participar ativamente em algum momento da Marcha da Maconha do Rio foi propor e realizar uma oficina de carimbos com o coletivo, carimbos em sedas.”
Nessas oficinas, os participantes esculpiam borrachas escolares com desenhos e ilustrações, que eram carimbados com tinta alimentícia em sedas para cigarro, divulgando a data da marcha ou outras mensagens. “Isso foi uma coisa que me motivou nesse lugar de prática, tanto artística quanto de formação política, nessa parte mais ativista relacionada às drogas”, conta. A atividade revisita a história da própria Marcha da Maconha no Brasil, uma vez que a primeira a ser realizada no pais, no Rio de Janeiro, em 2002, foi divulgada pela cidade com a mesma estratégia de sedas carimbadas distribuídas nos pontos mais legalizados da capital.
Para Layla, a arte tem um papel fundamental na abertura de espaços de diálogo sobre temas sensíveis:
“Eu acho que a arte tem esse potencial de abrir espaços de diálogo, de reflexão, de expressão, que muitas vezes outros campos não conseguem. E quando a gente fala de um tema tão complexo e tão carregado de estigmas como as drogas, a arte pode ser uma porta de entrada muito interessante.”
A tríade: Arte, Política e Educação
A conversa com Layla Waltenberg no Maconhômetro Educação evidencia como sua trajetória e seu trabalho são marcados pela integração entre arte, política e educação. Essa abordagem multidisciplinar permite que ela desenvolva práticas pedagógicas inovadoras, que valorizam as experiências dos estudantes e abrem espaço para discussões mais amplas e contextualizadas sobre as drogas.
“Quando eu proponho trabalhar com fanzines na educação sobre drogas, não é só uma questão de técnica, é uma questão de abordagem, de perspectiva, de como a gente olha para esse tema e como a gente convida os estudantes a olharem também”, explica.
O trabalho de Layla Waltenberg representa uma contribuição significativa para o campo da educação sobre drogas, oferecendo alternativas às abordagens tradicionais e demonstrando como a arte pode ser uma poderosa aliada na construção de diálogos mais honestos e significativos sobre o tema.
O episódio completo do Maconhômetro Educação está disponível abaixo, nos principais agregadores de podcasts disponíveis, no Youtube do Cannabis Monitor e aqui também no site. Confira!
O Podcast Maconhômetro Educação é um projeto do Cannabis Monitor em parceria com o Grupo de Pesquisa Educação e Drogas (GPED), que é um grupo de pesquisa vinculado ao Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Você pode conhecer mais sobre ele, suas ações, projetos de pesquisa e pesquisadores em gped.net ou no perfil do Instagram @gped.uerj.
O ep. Educação #12 | Educação sobre Drogas na Arte, com Layla Waltenberg contou com produção, roteiro e edição de Gustavo Maia (CM), e apresentação de Francisco Coelho e Luciana Bessa (GPED/UERJ).