Este trabalho sobre a maconha, dos pesquisadores Edward MacRae e Júlio Assis Simões, vem nos surpreender com os depoimentos de quem usa sem se sentir destinado ao fogo do inferno. É um trabalho sério, desprovido de preconceito, quase sem partido (digo quase porque não acredito na completa isenção do pesquisador e da pesquisa científica; a escolha de um caminho tem sempre a ver com o caminhante), e que coloca diante do leitor dados históricos e sociológicos de relevância; nos expõe o percurso de criminalização do uso da maconha no Brasil, nos afastando de sua história natural, pelo menos em regiões como o Nordeste, às margens do São Francisco, ao longo de quatorze seções bem documentadas, passando, ainda, entre outros aspectos, pelas circunstâncias da iniciação; controle social; controles informais, seus rituais e sanções, para concluir com pertinentes reflexões sobre a maconha e a Lei, atitudes com relação às campanhas de prevenção e a política. Não se trata de um texto contra ou a favor da maconha, mas sobre os que, livres para não usá-la, decidiram falar de suas histórias pessoais para Edward e Júlio que, competentemente, souberam ultrapassar o nível do mero voyerismo para encontrar a alma de cada contador, construindo para nós a realidade que a ficção de cada um permite evidenciar, basta saber ouvir.
